INFORMATIVO DO TSE
Número 6, Ano XXI, de 6 a 19 de maio
Sessão Administrativa
(não houve, no período abrangido pelo Informativo)
Sessão Jurisdicional
1. Inelegibilidade constitucional preexistente arguida em RCED e preclusão. Recurso Especial Eleitoral nº 142-42, Presidente Juscelino/MG. O Tribunal reafirmou sua tradicional jurisprudência, sintetizada na Súmula 47:
"A inelegibilidade superveniente que autoriza a interposição de recurso contra expedição de diploma, fundado no art. 262 do Código Eleitoral, é aquela de índole constitucional ou, se infraconstitucional, superveniente ao registro de candidatura, e que surge até a data do pleito."
No caso concreto, pretendia-se o reconhecimento da preclusão da inelegibilidade por parentesco, tendo em vista que o Ministério Público não a alegou por ocasião do pedido de registro, vindo a fazê-lo somente em sede de Recurso Contra a Expedição do Diploma. Não seria, portanto, uma inelegibilidade superveniente ao registro. O ponto fulcral é a previsão deste óbice à candidatura na própria Constituição Federal, art. 14:
“§ 7º São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.”
Considerando tratar-se de matéria constitucional, a maioria da Corte entendeu que ela não se sujeita à preclusão, podendo ser alegada no recurso cabível da diplomação.
2. Propaganda antecipada, mensagens em grupo de WhatsApp e liberdade de expressão. Recurso Especial 133-51, Itabaianhinha-SE. Os novos instrumentos de comunicação trazidos pelas mídias sociais e aplicativos de mensagem continuam a desafiar as molduras típicas dos ilícitos eleitorais, tradicionalmente pensados para jornais, rádios e emissoras de televisão. No caso concreto, alguém valeu-se de aplicativo de mensagens para enviar, para grupo restrito de pessoas, a propaganda de uma candidatura, antes de 15 de agosto do ano eleitoral, período em que a lei autoriza essa prática. A dúvida é se essa comunicação privada poderia ser considerada propaganda antecipada (punível com multa, nos termos do artigo 36 da Lei das Eleições) ou se, ao contrário, se insere no espaço válido da liberdade de expressão e troca de ideias. A conclusão vencedora, enunciada pela Ministra Rosa Weber, foi no sentido de que o caráter fechado do grupo ao qual se destinava a comunicação não teria o condão de prejudicar a igualdade de chances dos demais candidatos na eleição. Cabe registrar o posicionamento minoritário, do Min.Edson Fachin, para o qual o aplicativo de mensagens tem significativo poder de difusão.
A nosso ver, este é o ponto fulcral do debate: discernir entre comunicação privada e mensagens destinadas a público amplo. Estes aplicativos de mensagens muitas vezes substituem a conversa presencial, de pessoas próximas ou familiares. Ninguém pensaria em considerar propaganda antecipada a declaração de voto feita por alguém num almoço de família... Por outro lado, as eleições de 2018 demonstraram que estas mídias podem substituir, até com vantagem, os meios tradicionais de comunicação, permitindo divulgação ampla de mensagens, como se fosse um anúncio numa emissora de TV ou rádio. No primeiro caso, deve mesmo prevalecer a liberdade de expressão; no segundo, tem-se estratégia eleitoral de candidatos, merecedora de sanção se feita em sentido ao contrário do que a lei dispõe.
3. Mudança de jurisprudência: licitude da gravação ambiental realizada por um dos interlocutores. REspe nº 40898, Timbó Grande-SC. Ao julgar esse caso o TSE confirmou a alteração de sua jurisprudência em relação à licitude da gravação ambiental, realizada sem prévia autorização judicial, por um dos interlocutores. Fixou a seguinte tese:
“Admite-se, em regra, como prova do ilícito eleitoral a gravação ambiental feita por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro e sem prévia autorização judicial, seja em ambiente público ou privado”.
Sobre o tema, já trazido pelo Informativo nº 4, ano XXI, a Cachaça Eleitoral fez o seguinte comentário:
“As novas tecnologias propiciaram, entretanto, maior facilidade na comprovação de práticas ilícitas, que podem ser gravadas ou filmadas por aparelhos de telefone celular ou outros dispositivos. Diante da vedação constitucional às provas obtidas por meios ilícitos (art. 5o. LVI), surgiram dúvidas sobre a validade de gravações ambientais ou feitas por um dos interlocutores, sem autorização judicial. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal aceita gravações feitas por interlocutores, mesmo sem autorização judicial, quando se trata de prover a própria defesa ou registrar atos ilícitos. O leading case do Supremo Tribunal Federal é a Questão de Ordem no Recurso Extraordinário n. 583.937-RJ, relatada pelo Min. Cesar Peluso, na qual se decidiu que:
“Gravação ambiental. Realização por um dos interlocutores sem conhecimento do outro. Validade. Jurisprudência reafirmada. Repercussão geral reconhecida. Recurso extraordinário provido. (…) É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro” (julgado em 19.11.2009).
O TSE, após oscilação em sua jurisprudência (que chegou a decidir que gravações ambientais realizadas em ambientes abertos eram ilícitas, REspe 344-26), adotou a orientação do Supremo Tribunal Federal, para casos posteriores às eleições de 2014, conforme REspe n. 2-34-RN.”
A Ressalva trazida pelo Min. Roberto Barroso é para as situações nas quais se demonstrar que o interlocutor induz a conduta ilícita do outro ou o constrange à gravação, o que pode caracterizar, nos termos do Código Penal, art. 17, crime impossível por obra de agente provocador. Foi a solução retratada no caso 399-41-RS, que constou do Informativo nº 4.
4. Recurso em Mandado de Segurança nº 576-87, Luís Eduardo Magalhães/BA. A Constituição estabelece que o número máximo de vereadores de uma cidade depende da faixa populacional em que ela se insere. Em seu artigo 29, IV, a Lei Maior estabelece 24 faixas populacionais, estabelecendo, para cada qual, o número máximo de membros das Câmaras de Vereadores. As questões debatidas nesse recurso são as seguintes: i) o que se exige para considerar que a cidade cresceu em habitantes, fazendo jus a um número maior de representantes? ii) até quando é possível modificar a Lei Orgânica Municipal para contemplar esse número maior de representantes?
As duas questões foram respondidas no acórdão. O TSE entendeu que somente a publicação dos dados do IBGE no Diário Oficial oferece segurança para lastrear a mudança no número de vereadores, a despeito de divulgação destes dados na página do órgão. Em segundo lugar, a Corte entendeu que a mudança na lei orgânica só pode ser feita até a data das convenções partidárias, se se pretende que a ampliação do número de vereadores valha para a eleição daquele ano. Nos termos da Lei 9.504/97, as convenções devem ser realizadas entre 20 de julho e 5 de agosto do ano eleitoral (art. 8º).
No caso concreto, a alteração da lei foi publicada em 6.de julho de 2016, mas os dados do IBGE foram publicados oficialmente somente em 31 de agosto de 2016. O juiz eleitoral não autorizou que a mudança na lei orgânica produzisse efeitos já na eleição daquele ano, 2016 e o TSE negou provimento ao recurso em mandado de segurança impetrado contra esta decisão.
Publicados no Diário Oficial
Registro de Partido Político nº 1554-73/DF. Exigências para a anotação de modificações no estatuto de partido político. Os partidos políticos nascem, como pessoas jurídicas de direito privado que são, com o registro no Cartório Cível. Todavia, para que possam se valer de prerrogativas como a proteção de seu nome, o lançamento de candidatos, o recebimento de recursos do Fundo Partidário e a utilização do horário eleitoral gratuito, precisam obter registro de seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral. Para tanto, além do apoiamento mínimo de eleitores, precisam submeter a exame seu Estatuto, para verificação do atendimento das exigências constitucionais. Veja-se a Lei 9.096/95:
“ART. 7º § 1o Só é admitido o registro do estatuto de partido político que tenha caráter nacional, considerando-se como tal aquele que comprove, no período de dois anos, o apoiamento de eleitores não filiados a partido político, correspondente a, pelo menos, 0,5% (cinco décimos por cento) dos votos dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não computados os votos em branco e os nulos, distribuídos por um terço, ou mais, dos Estados, com um mínimo de 0,1% (um décimo por cento) do eleitorado que haja votado em cada um deles.
§ 2º Só o partido que tenha registrado seu estatuto no Tribunal Superior Eleitoral pode participar do processo eleitoral, receber recursos do Fundo Partidário e ter acesso gratuito ao rádio e à televisão, nos termos fixados nesta Lei.
§ 3º Somente o registro do estatuto do partido no Tribunal Superior Eleitoral assegura a exclusividade da sua denominação, sigla e símbolos, vedada a utilização, por outros partidos, de variações que venham a induzir a erro ou confusão."
Há um procedimento para este registro, que pode exigir a realização de diligências. Ao final, ouve-se o Ministério Público e decide-se pela concessão ou não do registro.
Por igual, a Lei dos Partidos exige que as alterações estatutárias sejam levadas ao Cartório Civil e submetidas a registro no TSE:
"Art. 10. As alterações programáticas ou estatutárias, após registradas no Ofício Civil competente, devem ser encaminhadas, para o mesmo fim, ao Tribunal Superior Eleitoral.
Parágrafo único. O Partido comunica à Justiça Eleitoral a constituição de seus órgãos de direção e os nomes dos respectivos integrantes, bem como as alterações que forem promovidas, para anotação:
I - no Tribunal Superior Eleitoral, dos integrantes dos órgãos de âmbito nacional;
II - nos Tribunais Regionais Eleitorais, dos integrantes dos órgãos de âmbito estadual, municipal ou zonal."
No caso vertente, o TSE deferiu apenas parcialmente a anotação das alterações estatutárias e deu prazo de 90 dias para que o Partido proceda às adequações demandadas. As recusas foram as seguintes: i) a anotação de duração das instâncias partidárias provisórias em período superior a 365 dias; ii) a possibilidade de destituição das comissões provisórias ou a substituição de seus membros, pela direção nacional, a qualquer tempo, sem devido processo; iii) duração de 10 anos para os mandatos; iv) obrigatoriedade de os filiados contribuírem financeiramente com o partido; v) multa em caso de desfiliação partidária; vi) exigência de adequação do emprego de recursos do Fundo partidário para promoção da participação política feminina ao quanto decidido pelo STF na ADI n. 5.617; vii) sujeição de pré-candidaturas à deliberação de um Conselho Gestor Nacional do partido; viii) exigência de “termo de renúncia” ao mandato de senadores que se desfiliarem do partido.
Esse acórdão pode ser interpretado de maneiras distintas, a depender do conceito que se tenha de autonomia partidária. Com efeito, a Constituição garante essa autonomia, como consta do art. 17”:
“§ 1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna e estabelecer regras sobre escolha, formação e duração de seus órgãos permanentes e provisórios e sobre sua organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações nas eleições majoritárias, vedada a sua celebração nas eleições proporcionais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.”
Para uma visão, a atitude do TSE teria sido “intervencionista”, reduzindo a autonomia do partido em prever seus estatutos, definir sua estrutura interna e a duração de seus órgãos provisórios. De nossa parte, formamos com opinião diversa, a de que os partidos, como qualquer outra instituição que receba recursos públicos ou sirva de meio para a disputa do poder político, não podem malferir a Constituição e sua cláusula democrática. Ao prever mandatos de 10 anos, claramente a agremiação partidária descumpre a Constituição. O mesmo ao prever a extinção de órgãos e substituições de membros sem o devido processo. Em relação à duração das comissões provisórias, o acórdão menciona a 23.571/2018, que prevê, para tanto, o prazo de 180 dias (Art. 39). Posteriormente à decisão adveio a Lei 13.831, de 17 de maio de 2019, segundo a qual, art. 3º :
"§ 3º O prazo de vigência dos órgãos provisórios dos partidos políticos poderá ser de até 8 (oito) anos."
Temos, porém, por inconstitucional esse prazo, equivalente a dois mandatos de deputados ou vereadores, mostrando sua total falta de razoabilidade. Por esta razão, entendemos que permanece o prazo máximo previsto na Resolução 23.571/2018.
Em adendo, é nitidamente abusiva a exigência de renúncia para o Senador eleito pelo partido que se desfilie, até porque, no sentido de decisão do STF, tem-se a Súmula nº 67 do TSE, segundo a qual:
“A perda do mandato em razão da desfiliação partidária não se aplica aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário.”
Por outro lado, reconhecemos o intervencionismo na decisão que nega a possibilidade de os estatutos partidários exigirem contribuições dos filiados (por que não?) ou mesmo em relação ao exame de pré-candidaturas por uma comissão nacional. A nosso juízo, isso cabe na autonomia partidária e não inflige a Constituição ou a Lei dos Partidos Políticos.
Luiz Carlos dos Santos Gonçalves