20 Jan
Superveniente é o que vem depois (mesmo que a lei diga o contrário!)

                                                       Por Luiz Carlos dos Santos Gonçalves

                                             Ex-Procurador Regional Eleitoral de São Paulo

                                                                        (2016/2019)


"A reforma eleitoral de 2019, Lei 13.877, de 27 de dezembro de 2019, trouxe uma modificação inoportuna, equivocada em seus próprios termos e, conforme entendemos, inconstitucional na redação do artigo 262 do Código Eleitoral. Ela incluiu novos parágrafos, renumerando os anteriores, com a seguinte redação:

“§ 1º A inelegibilidade superveniente que atrai restrição à candidatura, se formulada no âmbito do processo de registro, não poderá ser deduzida no recurso contra expedição de diploma.”

§ 2º A inelegibilidade superveniente apta a viabilizar o recurso contra a expedição de diploma, decorrente de alterações fáticas ou jurídicas, deverá ocorrer até a data fixada para que os partidos políticos e as coligações apresentem os seus requerimentos de registros de candidatos.

§ 3º O recurso de que trata este artigo deverá ser interposto no prazo de 3 (três) dias após o último dia limite fixado para a diplomação e será suspenso no período compreendido entre os dias 20 de dezembro e 20 de janeiro, a partir do qual retomará seu cômputo.

            Diga-se que esta inovação havia sido vetada pelo Presidente da República, como contrária ao interesse público, tendo sido derrubada pelo Congresso Nacional em prazo inferior a um ano das eleições de 2020, sendo a elas inaplicável, a teor do artigo 16 da Constituição.

            Pela redação dada aos parágrafos 1º e 2º do artigo 262, a categoria jurídica da “inelegibilidade superveniente” deixa de existir. Remorando seu conceito, trata-se daquela situação geradora de inelegibilidade surgida entre a data do pedido de registro e, segundo a Súmula 47 do TSE, até a data do pleito. Ora, esses parágrafos dizem que a inelegibilidade superveniente “deverá ocorrer até a data para que os partidos políticos e as coligações apresentem os seus requerimentos de registros de candidatos”, ou seja, até o momento do pedido de registro. Logo, não é superveniente! Se a inelegibilidade surgir até a data acima mencionada, deverá ser deduzida por meio da Ação de Impugnação ao Pedido de Registro, ou seja, será anterior ao registro. Superveniente, convém esclarecer ao Exmo. Sr. Legislador, é o que vem depois!

                Tem-se, então, a inconstitucionalidade, pois esta inovação legislativa, a despeito de sua redação tortuosa, pretende impedir que inelegibilidades surgidas após o registro sejam levadas ao Judiciário, com as consequências a elas inerentes: a cassação do registro ou do diploma. Assim, pessoas condenadas por crimes ou atos de improbidade administrativa ao longo da campanha ficarão imunizadas contra os efeitos da Lei da Ficha Limpa. A ofensa ao artigo 14, § 9º da Constituição – que fala do papel das inelegibilidades para assegurar eleições lisas e justas e coarctar o abuso do poder econômico e de autoridade - não poderia ser mais clara.

                      Salva-se o parágrafo terceiro, que apenas disciplina prazos.

                       Taí uma boa ADI para levar ao Supremo!"


                                                                                  





Photo credit: Jamiesrabbits on VisualHunt / CC BY

Comentários
* O e-mail não será publicado no site.